A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, pediu a substituição do termo “sensibilidade” por “senciência”. Qual a diferença entre esses conceitos?
Por Liryel Araújo
No âmbito do debate sobre a modernização do Código Civil brasileiro, o reconhecimento dos direitos animais vem emergindo como um dos temas mais significativos do momento. Uma proposta liderada pela Ministra Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima defende a redefinição do status jurídico dos animais, posicionando-os como seres de direito, em vez de meros bens ou propriedades dos seres humanos.
O juiz federal Vicente de Paula Ataíde Junior, de Curitiba, indicado pela Associação dos Juízes Federais (Ajufe) para integrar a comissão de juristas encarregada de revisar o Código Civil, é um defensor fervoroso dessa abordagem. Com formação em direito animal pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), o magistrado argumenta que os animais devem ser reconhecidos como seres sencientes, capazes de sofrer e de experimentar conscientemente o mundo ao seu redor. Ele enfatiza que essa característica singulariza os animais, conferindo-lhes uma dignidade intrínseca.
Embora a Constituição brasileira proíba explicitamente a crueldade contra os animais, Ataíde Júnior destaca a necessidade de adaptar o Código Civil para refletir essa visão progressista. Ele ressalta que, no Dia Nacional dos Bichos, há razões para otimismo diante das discussões em curso.
A Comissão de Juristas encarregada da reforma do Código Civil debate a mudança na natureza jurídica dos animais. A proposta envolve a remoção da categoria dos animais como meros “bens móveis” para uma qualificação mais adequada. Isso implica reconhecê-los como seres vivos dotados de sensibilidade e passíveis de proteção jurídica, em conformidade com sua natureza especial.
A sugestão de substituir o termo “sensibilidade” por “senciência”, apoiada pela Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reflete a evolução conceitual nesse campo. A senciência, que se refere à capacidade de sentir e de experimentar conscientemente o mundo ao redor, é considerada uma característica fundamental dos animais que os distingue de meros objetos.
Além disso, a proposta visa retirar a expressão que define os animais como “objeto de direito”, reconhecendo que essa abordagem os mantém na condição de simples propriedade, sem avanços práticos em relação aos seus direitos. Embora o Brasil tenha avançado na proteção dos direitos dos animais, reconhecendo sua senciência de maneira implícita na Constituição, ainda há espaço para melhorias. Outros países, como Áustria, Alemanha e Suíça, já alteraram seus códigos civis para reconhecer que “animais não são coisas”, enquanto países como França, Portugal e Espanha reconhecem os animais como seres vivos dotados de sensibilidade.
No entanto, a equiparação dos animais a filhos humanos não está em discussão. O foco está na necessidade de reconhecer sua condição como seres sencientes e dignos de proteção jurídica, alinhando-se aos princípios constitucionais e às decisões judiciais recentes.
Quanto às questões práticas, a proposta do novo Código Civil busca regular situações como a divisão das despesas relacionadas aos animais de estimação em casos de divórcio ou separação. Não está prevista a imposição de prisão em caso de inadimplência, mas sim a aplicação de medidas judiciais adequadas para garantir o cumprimento das obrigações relacionadas aos animais de estimação, sem equipará-los aos filhos humanos.